* Mario Antonio Ferrari
Os médicos, desde antes da
constituição de 1988, almejam uma carreira semelhante a dos juízes, promotores
e profissionais do executivo como militares, diplomatas e fiscais da receita
federal.
A Constituição de 1988, ao atribuir
um regime jurídico único a todos os servidores, e ao incorporar os contratados
pela CLT, criou certa dúvida em relação a quais seriam as carreiras de estado.
Os magistrados, os membros da Advocacia da União, os do Ministério
Público, entre outros, cuidaram de qualificar suas carreiras como sendo de
estado, mencionando esse fato na esfera constitucional.
Levando-se em consideração que a saúde é dever do Estado e,
portanto, deve ser levada a efeito por profissionais integrantes de carreira de
estado, os médicos, através do movimento sindical, há muito tempo encaminham a
luta pela criação da carreira própria.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC nº 454/2009), seguindo
essa lógica, abre possibilidade à criação da carreira de estado para os médicos
situando-a no plano constitucional.
Em seu art. 197-A, estabelece que no serviço público federal,
estadual ou municipal, a medicina é privativa dos membros da carreira única de
médico de Estado, organizada e mantida pela União. Em seguida subordina essa
regra a uma série de princípios e diretrizes.
Os incisos I e II repetem requisitos já estabelecidos para as
carreiras do judiciário e do ministério público. Assim, o ingresso na carreira
fica condicionado a concurso público de provas e títulos, com a participação do
respectivo órgão de fiscalização profissional, devendo as nomeações respeitar à
ordem final de classificação. O exercício do cargo fica condicionado ao regime
de dedicação exclusiva e o médico dessa carreira não poderá exercer outro cargo
ou função pública, salvo uma de magistério.
O inciso III, ao estabelecer os critérios de ascensão funcional do
médico de Estado, inova ao considerar que os critérios de merecimento e
antiguidade devem levar em consideração quesitos de acordo com normas
estabelecidas pela Associação Médica Brasileira e pelo Conselho Federal de
Medicina. No judiciário e no ministério público as regras emanam das
respectivas leis orgânicas.
Quanto à movimentação dos médicos de Estado, a previsão do inciso
IV registra que a lei estabelecerá critérios objetivos de lotação e remoção
segundo a necessidade do serviço e considerando, para a elaboração dos
requisitos de remoção, a pontuação por lotação em localidades remotas ou de
difícil ou perigoso acesso. Essa regra lembra à existente no âmbito das forças
armadas, nos respectivos regulamentos de movimentação.
No inciso V podemos observar regra que já existe para outros
profissionais de carreiras de Estado. Assim o médico de Estado não poderá, a
qualquer título ou pretexto, receber honorários, tarifas ou taxas, auxílios ou
contribuições de pessoas naturais ou jurídicas, públicas ou privadas, nem
participar do produto da sua arrecadação, ressalvadas as exceções previstas em
lei.
Outra modificação está presente no inciso VI. Nesse dispositivo
destaca-se que a retirada do poder de regulação e fiscalização do exercício
administrativo e funcional do cargo de médico de Estado do Conselho Federal de
Medicina.
Os médicos dessa carreira passam a ser regulados e fiscalizados por
outro órgão colegiado federal que, com funções exclusivas de normatização, de
correição funcional e de ouvidoria, em cuja composição paritária, terá médicos
de Estado eleitos pelos membros da carreira, por representantes da sociedade
civil, não pertencentes à categoria médica, e por representantes do Ministério
da Saúde.
Retira-se, constitucionalmente, o poder dos conselhos de
fiscalizarem os médicos no serviço público. Isso em certa medida, mas por
razões distintas, já ocorre no âmbito das forças armadas.
O inciso VII, extingue a carreira dos médicos federais concursados
pelas regras anteriores à promulgação da Emenda à Constituição. O ideal seria
transformar a carreira dos médicos federais em carreira de estado e não
extinguir a que se têm para depois criar outra. É importante anotar que os
médicos federais já estão separados das demais carreiras.
Já o inciso no VIII a PEC extingue as carreiras dos médicos
concursados nos estados e municípios. Essa questão é delicada por ofender o
principio da autonomia federativa. Não fosse isso, cabe lembrar que muitos
estados fizeram opção ou encaminham alternativas legislativas para criação de
carreiras de estado nas suas esferas. Tais iniciativas nascidas da luta
sindical médica estão sendo desconsideradas. A PEC pretende acabar com as
carreiras de estado do DF, de Alagoas, do Piauí e de outros estados?
Por último, a PEC poderia ser mais explícita e acolher o Piso
Fenam como o referencial mínimo de remuneração. Ao definir que o piso será
fixado por lei transfere para o gestor a definição do parâmetro. Sabemos que
essa questão é delicada e nem sempre é encaminhada como o movimento sindical
defende.
Feitas as
considerações, que devem se prestar ao debate, cabe o registro de que a
iniciativa da carreira de estado é um sonho para muitos médicos e por isso deve
ser muito bem discutida para que não se cometa o pecado de frustrar
expectativas.
*Mario Antonio Ferrari – Presidente do Sindicato dos Médicos no Estado do Paraná (SIMEPAR), Secretário Geral da Federação Nacional dos Médicos (FENAM). Curitiba, 18/10/2015
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